sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

Viajando pelo velho mundo

Viajar é muito bom. Nem precisa ser uma grande viagem atravessando oceanos, uma praia ou uma zona rural qualquer perto do local onde moramos já serve para mudar de ares, esquecer um pouco do trabalho e das mazelas da vida. Relaxar, enfim. 

Viajar pela Europa, sonho que nem todos podem realizar, pode ser ótimo. Ou não. Afinal, é apenas outro lugar, com prazeres e desprazeres diferentes daqueles aos quais estamos acostumados. Melhor do que o Brasil em muitos aspectos, pior em outros.


O lado bom


As cidades, em geral, são mais amigáveis do que as nossas, feitas para pessoas viverem, não apenas para empresários ganharem dinheiro. Transporte coletivo decente, espaços públicos limpos e agradáveis, arquitetura e monumentos preservados, rios limpos no meio da cidade, praias urbanas sem poluição. Sim, sabemos que eles conquistaram seus excelentes níveis de educação e qualidade de vida às custas da exploração colonial. Somos chatos, não ignorantes. 


Muitos museus excelentes, sítios arqueológicos, vestígios bem preservados de civilizações antigas, castelos e palácios, cidades históricas. Temos quase tudo isso aqui, mas lá a quantidade é bem maior. Tanto que, no início, a gente se deslumbra ao ver um castelo, mas depois de uma semana, não aguenta mais tanto castelo. Nós nem entramos mais neles, não apenas porque o ingresso é caro, mas porque já não achamos tanta graça. Quem viu um castelo, viu (quase) todos.


Belezas naturais diferentes das nossas. Montanhas enormes, paisagens nevadas, florestas que parecem saídas de contos de fadas (talvez porque os contos de fadas sejam europeus). As praias geralmente são piores do que as nossas, mas têm sua graça. Praias de pedra com água absurdamente azul e limpa, escadinhas para entrar no mar encravadas nas rochas, gente trocando de roupa placidamente no meio do povo, mulheres fazendo topless sem que o mundo desabe por causa disso. Praias cheias de bares que alugam espreguiçadeiras não são do nosso agrado, porque preferimos as vazias com areia disponível para esticar um pano e deitar em cima, mas, para quem gosta, deve ser uma boa experiência. Lotadas, mas limpas e arrumadinhas.


Vinhos, queijos e frios de qualidade, que por aqui seriam muito caros, perfeitamente acessíveis aos bolsos dos turistas brasileiros de classe média, em qualquer supermercado. Mesmo itens mais banais como frutas, sucos e sobremesas industrializadas, nos mercados e supermercados europeus são bem melhores do que os nossos, e, em alguns casos, até mais baratos. O mais triste é tomar café brasileiro na Europa bem melhor do que o café brasileiro daqui, porque nosso melhor café é todo exportado.


O lado não tão bom


O transporte coletivo funciona, mas nem sempre é acessível. Nas estações de trem e metrô às vezes a gente tem que carregar malas escada acima (ou abaixo), porque escadas rolantes e elevadores não existem. Coisa de país antigo, com estações construídas na época do império romano. Na volta de nossa viagem mais recente à Espanha, planejamos a ida ao aeroporto com antecedência. Como estávamos hospedados mais ou menos perto da estação de trem, estudamos o caminho pra ver se dava para ir à pé. Até dava, mas optamos por pegar um táxi, por causa do calor. Verificamos as condições do local, analisamos se era melhor ir de trem ou de ônibus, procuramos o ponto e observamos se passavam vazios. Somos chatos que não gostam de surpresas.


Dificuldade de comunicação. Não é fácil se comunicar em outro país, mesmo que a gente fale mais ou menos bem o idioma local. No hotel, nos restaurantes e nos museus, tudo bem, mas as coisinhas simples do dia-a-dia podem ser problemáticas. Comprar bilhetes para o metrô e ônibus, por exemplo, em bilheterias automáticas. Na Espanha, dependendo da região, a máquina pode falar com a gente em catalão, valenciano, galego etc., qualquer coisa, menos espanhol. Abastecer o carro, comprar remédio na farmácia, pagar o pedágio, tudo isso pode virar um pequeno, mas irritante, problema. E se a gente levar uma multa? Bem, no nosso caso a dona da pousada onde estávamos hospedados, gentilíssima, explicou como pagar e preencheu o formulário necessário. Sem essa ajuda, teria sido difícil. E brigar em outro idioma? Se o malandro da pousada aluga seu quarto reservado há meses para outra pessoa e você precisa brigar em péssimo inglês com um croata, pelo celular emprestado de uma nativa que está tentando te alugar um quarto imundo na casa dela? Aconteceu conosco, não foi divertido e não adiantou. A sacanagem estava feita, só nos restou denunciar o safado para o site de reservas e pagar caro em outro local.


Comer, essa necessidade tão básica, pode ser complicado. É mais ou menos assim: a gente precisa encontrar um restaurante agradável, não muito caro, que tenha cardápio que a gente entenda e pratos que a gente coma na hora em que estivermos com fome. Para isso, é preciso sorte ou muita organização, principalmente para quem é chato e não come qualquer coisa. Pode ser muito cansativo procurar um restaurante que preencha todos os requisitos acima na hora em que estamos morrendo de fome e de cansaço. O jeito é comprar queijo, vinho, presunto, pão, saladas e frutas no supermercado, o que é ótimo, mas às vezes enjoa. E o arroz com feijão faz uma falta danada.


Quem ganha, o lado bom ou o mal?


O bom geralmente ganha. Quando a gente volta pra casa, o que fica na memória são os bons momentos, e os maus acabam virando piada, mas é bom não ter muitas fantasias ao viajar para outros países. Viagens idílicas e românticas só existem nos filmes, a realidade tende a ser mais dura, cheia de voos e trens atrasados, conexões perdidas, malas extraviadas, hotéis e restaurantes decepcionantes, escadas, padrões de higiene mais baixos do que os nossos, choques culturais e sustos diversos. Não tudo na mesma viagem, felizmente.


sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

São Bento do Sapucaí

É uma cidade muito pequena na região da Mantiqueira paulista, não muito longe de Campos do Jordão. Pequena e simpática, mas nada bonitinha. É apenas um cidade do interior, cheia de casas antigas, ainda não enfeitada e maquiada para o gosto dos turistas. Achamos um tanto sem graça, mas, se o objetivo é descansar e fazer uns passeios tranquilos, São Bento é um local adequado. 






Não há nada para fazer na cidade, mas os restaurantes e cafés, todos simples, são bons e não muito caros. Ainda não chegaram à pequena São Bento os estabelecimentos que se pretendem chiques, mas são apenas caros, como os da vizinha Campos do Jordão. Há cervejas, café e sorvetes de marcas  regionais, todos ótimos. Cervejas artesanais de frutas, mel, manga e outros sabores diferentes estão à disposição em qualquer lugar, inclusive no supermercado. 

A grande atração é o Monumento Natural Estadual Pedra do Baú, formado por um complexo rochoso que inclui a Pedra do Baú, a Pedra do Bauzinho e a Pedra da Ana Chata.  São pedronas, mas a gente pode chamá-las de montanhas, sem problemas. A Pedro do Baú alcança 1950 metros de altitude, e pode ser vista de vários pontos da cidade, em diferentes ângulos. Para conhecer as pedronas de perto, é preciso pegar uma estradinha sinuosa, pavimentada em sua maior parte, e chegar até a entrada do parque. Paga-se uma taxa para entrar, mas nós, que além de chatos somos velhos, não pagamos nada. É o lado bom do início da velhice, não pagar para entrar nos parques, mas ainda aguentar fazer as trilhas, que lá são três: Bauzinho, de 470 metros e 30 minutos de duração, Ana Chata, de 3.800 metros e duas horas de duração, e Pedra do Baú, 4000 metros, 3 horas. Fizemos apenas a do Bauzinho, muito fácil. Decidimos não nos arriscar na outras duas, e ficamos bastante satisfeitos com a nossa. A paisagem é lindíssima, com direito a vista da região e da Pedra do Baú, que de perto não parece um baú. 

     Pedra do Baú, vista de baixo, na cidade

    Pedra do Baú, vista do parque





A região, dizem, tem muitas cachoeiras, mas só conseguimos ver uma bem pequena, na estrada. Segundo o moço da pousada, todas estão localizadas em propriedades particulares e, como a prefeitura estaria se lixando, os donos abrem se quiserem, só aos fins de semana. A única que, supostamente, estaria aberta, não estava. Era feriado do Natal, 24 e 25 de dezembro, o que explica muita coisa. Em todo o caso, se vocês forem a São Bento do Sapucaí, preparem-se para não ver cachoeiras. Detalhe: não há como obter informações, o único jeito é chegar até o local e dar com a cara da porteira fechada, apesar da placa informando que deveria estar aberta.

No bairro do Quilombo fica a loja da Arte no Quilombo, da associação de moradores do local, com peças muito bonitas, com destaque para as feitas de palha. Ali pertinho fica o ateliê do escultor Ditinho Joana, bastante famoso na região. Parece que se pode visitar o ateliê e ver o artista trabalhando, mas nesse dia estava fechado.

Que mais fazer em São Bento do Sapucaí? Bem, subir até o Mirante do Cruzeiro. Nada demais é só uma subidinha básica. Lá em cima tem uma vista bonita e uma cruz feiosa. Vale a pena, quando não se tem muito o que fazer. 



Outra atração simples, mas bonitinha, são as capelas de mosaicos, obras dos artistas Ângelo Milani e Cláudia Vilar, construídas com todo o tipo de cacos de cerâmica e vidro, fragmentos de estátuas etc. São três, mas, por falta de informação, não vimos a maior e mais antiga, que fica no centro da cidade, na propriedade dos artistas. Ãngelo também é responsável pela criação do mural de uma escola, construído com a ajuda das crianças que lá estudavam. Ao que parece, o mosaico é uma tradição local.





Caminhar pelas estradas, fotografando a paisagem, também é agradável.




Demos um pulinho em Gonçalves, ali perto, mas não precisava. Cidade pequena e também sem muita graça. Nem tentamos as cachoeiras, porque imaginamos que estariam fechada. 

É isso. São Bento é boa sugestão para um final de semana prolongado, para quem gosta de sossego, mosaicos e paisagens montanhosas. 




quarta-feira, 11 de janeiro de 2023

De volta a Buenos Aires

Voltamos a Buenos Aires, uma de nossas cidades prediletas, depois de alguns anos e uma pandemia. O segundo destino de nossa possível retomada do agradável hábito de viajar foi escolhido pelos fatores proximidade (voo curto, menos chance de contágio) e sossego (um lugar já conhecido reduz a possibilidade de estresses de viagem). 

Deu certo. Nossa curta estada em Buenos Aires foi agradável como sempre, até mesmo no fator clima, friozinho, dias claros, um pouco de chuva, mas nada que incomodasse dois brasileiros andarilhos e habituados ao clima sem piedade de São Paulo.

Duas decepções: fecharam nossa sorveteria predileta, o centenário Vesúvio, e um dos nossos restaurantes mais queridos, onde passamos o Ano Novo algumas vezes, o Arturito. A crise econômica e a pandemia acabaram com o Vesúvio, onde tomávamos sorvete de doce de leite, puro ou com nozes, e figos ao conhaque. Com o Arturito, não sabemos o que aconteceu. Como lembrança, guardamos os guardanapos personalizados que ganhamos lá numa dessas passagens de ano. Uma pena, ou melhor, duas penas.

Felizmente, não faltam sorveterias e restaurantes simpáticos na cidade. Reencontramos a pizzaria Roma, que serve pizzas boas e baratas num ambiente barulhento e popular, e o Cumaná, onde se comem pratos da cozinha regional argentina, muito criativos e bem diferentes das carnes e massas da cidade - que também são muito boas. O melhor de tudo: Buenos Aires é uma das poucas cidades que conhecemos onde se pode pedir um  bom vinho no restaurante sem ir à falência. Vinhos, na Argentina, geralmente são até mais baratos do que cerveja.




E claro, como não podia deixar de ser, fizemos a ronda das livrarias, fomos ao Museu Nacional, maravilhoso e gratuito, e voltamos ao nosso cinema predileto em Buenos Aires, o Cine Gaumont-Incaa, agora reformado. Infelizmente, o filme que vimos não era muito bom e os diálogos estavam bem difíceis de entender, mas valeu pelo reencontro com o cinema.


Fizemos um longo passeio, a pé, pelos Bosques de Palermo, onde encontramos alguns monumentos que não conhecíamos, como o Pátio Andaluz e a Coluna Persa.






Uma experiência diferente: dessa vez encontramos o Jardim Japonês, que já conhecíamos, com cerejeiras floridas. Um espetáculo inacreditável de lindo, mesmo com um pouco de chuva e muita gente.





A caminho do Jardim, entramos num museu que não conhecíamos, o Museu Nacional de Artes Decorativas, instalado no palácio que pertenceu à família Errázuriz Alvear. Palácios e artes decorativas não estão entre nossos maiores interesses, mas estávamos precisando de uma pausa, e entramos. O museu é bonito, e estava com instalações de arte contemporânea em todas as salas, dialogando com os espaços e acervo. Valeu a pena. 



Em Palermo fica o parque El Rosedal, um jardim de rosas. No inverno, as roseiras não estão floridas, mas no verão o local é um espetáculo. Anotem aí: Jardim Japonês com cerejeiras no inverno, Rosedal com rosas no verão (mas os jardins são um bom passeio em qualquer época do ano).

Bem perto do Rosedal está o pequeno Museu Eduardo Sivori, que além da coleção, também tem um jardim interno, bom para descansar pés e pernas exaustos.



E não podia falta uma visitinha à Floralis Generica, na Recoleta, a gigantesca flor metálica que representa, segundo seu criador, todas as flores do mundo. Ela abre e fecha conforme a luz do sol, mas nunca testemunhamos esse evento.





Gostamos de ver que o Gomero da Recoleta, uma árvore com 10 metros de diâmetro e galhos com cerca de 30 metros de comprimento, tida como a mais antiga da cidade, ganhou um reforço poderoso: o titã Atlas, que deixou de sustentar o globo terrestre e foi lá dar uma força para o Gomero.





Leiam também:  Um tango de Carnaval e Buenos Aires política, sobre outros momentos nossos na cidade.