terça-feira, 29 de abril de 2014

Quatro dias em João Pessoa

Um chato só consegue preservar sua chatice no Nordeste brasileiro até provar a comida ou botar os olhos sobre uma praia.

A comilança nordestina começa no café da manhã com tapioca, cuscuz, cuscuz de tapioca, curau, pamonha, bolo de rolo, banana cozida ou frita, sucos de frutas da terra e o que mais vier. Dá até raiva de ver gente comendo salsicha com molho de tomate. E continua ainda melhor nas outras refeições. As praias tem mar verdinho, areia branca, coqueiros e, com sorte, falésias coloridas. E o sol é praticamente uma certeza, todos os dias. O único defeito das praias nordestinas, para o gosto destes chatos, é o que muita gente considera sua maior qualidade: a temperatura morna da água do mar. Esses chatos preferem água fria, como não poderia deixar de ser.

João Pessoa não é um destino turístico tão badalado como Natal, Fortaleza e Maceió, mas poderia perfeitamente ser, porque tem as coisas boas do Nordeste em tamanho concentrado, sem tanta agitação e mais barato. A cidade é relativamente pequena e fácil de conhecer, com uma orla bem cuidada e praias urbanas ainda limpas. As melhores praias, ao Sul, já no município de Conde, ficam a uns 30 km de João Pessoa. De carro chega-se fácil, por estradas razoáveis, o que elimina a necessidade de contratar aqueles irritantes passeios com guias, atrasos e pausas para almoço em lugares discutíveis.

Estivemos em João Pessoa há uns 10 anos, mais ou menos, simpatizamos e decidimos voltar. Não nos arrependemos.


Centro histórico
Fica meio longe da orla e, talvez por isso, não muito explorado pelos locais e pelos turistas. Tivemos sorte de sermos conduzidos pelos principais pontos de interesse do centro por uma amiga local.

Belos edifícios antigos - alguns bem conservados e outros nem tanto. A igreja de São Francisco é mais bonita e por ali perto tem a Basílica da cidade, a Igreja do Carmo e o Mosteiro de São Bento. Outros bonitos edifícios são a atual sede da prefeitura (antigos Correios) e  o Teatro Santa Roza.

Igreja de São Francisco

Praias
Alugamos um carrinho do modelo mais barato e partimos rumo ao Sul. No primeiro dia a intenção era chegar em Coqueirinho. Aportamos numa praia bonita, com coqueiros e bastante sossegada, andamos feito uns malucos de um lado para o outro como sempre fazemos e à noite descobrimos que não chegamos em Coqueirinho, mas em Carapibus. Tudo bem, andamos tanto que passamos por Tabatinga e chegamos ao início de Coqueirinho, para onde fomos no dia seguinte. São todas ótimas praias, mas Coqueirinho é um daqueles lugares onde é difícil chegar de carro: tem uma ladeira de terra batida bastante íngreme, estacionamentos lotados e trânsito meio infernal.

Carapibus

Coqueirinho pode ser a melhor opção para quem acha que praia é sinônimo de boteco. A zona botequeira de lá é forte, e ainda tem um restaurante famoso que fica no meio de uma espécie de cânion. Não fomos nem no restaurante nem nos botecos, gostamos de sossego e não temos o hábito de comer na praia porque achamos meio nojento. Preferimos andar novamente feito uns malucos pra longe da muvuca, passando por falésias que parecem paisagem de outro planeta até chegar na divisa de Tambaba. Para nosso gosto, Carapibus e Tabatinga são mais interessantes, porque são mais fáceis de chegar e mais sossegadas. Há diversos pontos pouco concorridos para estacionar, poucos bares e a paisagem é igualmente bonita.

Tabatinga

Coqueirinho

Tambaba é um caso especial. A praia é dividida em duas partes, uma aberta ao público de roupa em geral, outra dedicada ao naturismo, ou seja, é uma praia de nudismo oficial e regulamentada. Na parte naturista só se pode entrar sem roupas - mas boné e chinelo pode - e não são permitidas fotos ou filmagens. Dessa vez resolvemos ficar na parte vestida, mas já fomos à Tambaba naturista e recomendamos muito. Não, não dá vergonha. Por que ter vergonha se está todo mundo sem roupa? E estar gordo(a) ou ser velho(a) também não é problema, porque ninguém vai lá para se exibir e muito menos para olhar os outros. As pessoas só querem ficar em contato com a natureza sem roupas. Na verdade, as pessoas numa praia de nudismo olham muito menos as outras do que nas praias "normais", vá tranquilo(a). Mas se você definitivamente não pretende tirar o maiô, fique na parte vestida de Tambaba, que é igualmente bonita e quase deserta. Tem uns botequinhos na entrada, e só. Tem que pegar uma trilha de fácil acesso e começar o passeio visitando pequenas praias meio escondidas entre a vegetação e as pedras. Depois de umas três ou quatro prainhas, chega-se à praia de falésias coloridas, uma paisagem espetacular.

Tambaba


Pôr do Sol 
Um dos programas turísticos mais conhecidos na cidade é o pôr do sol no Jacaré ao som do Bolero de Ravel interpretado ao saxofone por um músico local. Jacaré é uma praia fluvial localizada em Cabedelo, cidade portuária que faz divisa com João Pessoa. O Bolero é aquele mesmo "clássico popular" que todo mundo conhece (há quem goste). Fomos ver o tal pôr do sol, que efetivamente é bonito, mas, guiados por nossa amiga moradora da cidade, evitamos cuidadosamente o bolero. Chegamos por volta das 17h30, fizemos umas fotos do último adeus do  sol e saímos rapidinho, antes do artista tocar a Ave Maria - que também não era de nosso interesse. 

Jacaré

O lugar é simpático e agitado, cheio de bares, lojinhas e muita, muita gente. Quem quiser encarar o Bolero, tem que chegar antes das 17 horas e bem preparado para a muvuca. Os chatos, naturalmente, se tiverem que ouvir o Bolero, preferem a versão orquestral. Só para conferir, procuramos no Youtube e achamos uma droga o tal saxofone, mas gosto é gosto.

Antes de ir ao Jacaré nossa amiga nos levou ao forte de Cabedelo. O pôr do sol lá também é lindo, com vista para o Jacaré e sem bolero nem  muvuca. Fica a dica ...

Forte de Cabedelo


Comida 
Comer no Nordeste é uma experiência quase emocionante, de tão boa que é a comida.  Comemos muito bem no Mangaí, restaurante por quilo que serve comida regional, em Manaíra e no Gulliver Mar, em  Cabo Branco. Esse último é um restaurante um pouco mais sofisticado, mas come-se bem e nem é tão caro.  Ambos dicas da amiga local. Também experimentamos o Flash, um restaurante simples em frente à praia de Manaíra,  e gostamos. Comida bem feita, preço honesto. Já o Chapéu de Couro, um restaurante de hotel na praia de Tambaú não é grande coisa. Comida razoável, mas o ambiente é meio deprimente.


Mais fotos
https://www.flickr.com/photos/jo_ma/sets/72157644260875706/







segunda-feira, 7 de abril de 2014

Croácia

Por que será que dois chatos que sempre repetem os mesmos roteiros decidiram se destabocar para a Croácia? Talvez tenha sido o chamado do mar... E por isso o roteiro de nossa incursão por esse pais limitou-se quase que exclusivamente à faixa litorânea, de norte a sul.

Como decidimos não passar pela capital, Zagreb, entramos na Croácia por Veneza. Há ferries de Veneza para as cidades de Rovinji e Pula, cidades da Istria - uma espécie de Itália do outro lado do Adriático. A duração do percurso é de pouco mais de 3 horas.

Percorremos todo litoral de carro, até a cidade de Dubrovnik e de lá voltamos para a Itália (Bari) de ferry - 9 horas de travessia.


Rovinji
Rovinji tem um bonito centro histórico todo construído em pedra calcária branca, uma orla pedregosa e um mar profundamente azul. Na verdade, a julgar pelo que vimos, todas as cidades turísticas na orla croata tem centros históricos em pedra branca, mar azul e praia rochosa, mas que vai se incomodar com isso?


Nosso primeiro choque cultural na Croácia foi, decididamente, relacionado ao conceito de praia no país, um tanto estranho para o gosto brasileiro. Na pousada havia um colchonete dobrável à nossa disposição, cuja função só fomos descobrir ao passear pela orla: é o que se usa para para tomar sol nas pedras. Toalhas ou esteiras não são muito adequadas para essa finalidade em solo pedregoso. Outro item engraçado são as sapatilhas de plásticos que eles usam para entrar no mar,  para não machucar os pés nas pedras pontudas e nos ouriços! À venda nos melhores camelôs litorâneos.

Não há muito o que fazer na cidade, mas dá para ficar um dia todo passeando pelo centro histórico e pela orla, examinado as lojinhas que vendem bijuterias de coral de várias cores.

Em Rovinj sentimos pela primeira vez o perfume que nos acompanharia por toda a viagem. Nas cidades arborizadas, cheias de jardins e quintais com árvores frutíferas, é muito comum encontrar pés de figo muito perfumados. A Croácia, no verão, cheira a figos.


Pula
Passamos apenas umas horinhas em Pula, para dar uma espiada no anfiteatro romano que tem por lá. Impressionante, mas é só isso, um anfiteatro romano.



Zadar
Em Zadar há diversos monumentos históricos interessantes, como a enorme igreja bizantina de São Donato, cercada por vestígios de templos greco-romanos e o Museu Arqueológico Nacional, não muito grande mas muito bem montado.

Mas o melhor de Zadar, a cidade-sereia da Croácia,  é o Órgão Marinho - impossível resistir ao canto do mar que vem desse inusitado instrumento. Sim, é de fato um órgão gigante instalado sob uma escadaria de mármore à beira-mar, cujo som é resultado da movimentação das ondas nos orifícios sob a escada, que parece um teclado. A música lembra, por vezes, o canto das baleias. E o mais bacana é que, como o órgão está na "praia" da cidade, a gente pode cair na água e nadar ouvindo sua música. Vejam e ouçam:



Perto do órgão está outro brinquedo bonito de Zadar, construído pelo mesmo arquiteto: o Painel Solar, uma instalação que acumula a luz solar durante o dia, e à noite se ilumina em várias sequências de cores. As pessoas ficam passeando e brincando sobre o painel, totalmente encantadas.





Para conhecer Zadar tranquilamente, visitar o museu, nadar ao som do órgão, ver o por-do-sol na orla e brincar no Painel Solar, é bom passar pelo menos duas noites por lá.


Parque Nacional Plitvicka Jezera
Ou, mais simplesmente, Parque dos Lagos, uma inesquecível beleza croata. Trata-se de um parque natural muito bem preservado, onde vários lagos localizados em diferentes níveis formam inúmeras cachoeiras, uma mais bonita do que a outra. Para aproveitar bem e não morrer de cansaço, o ideal é bom reservar um dia inteiro para passear no parque. O parque é tão organizado que oferece diversas opções de trilhas, com diferentes tempo de percurso. A caminhada não é difícil, até velhinhos e crianças pequenas fazem, mas o parque é grande. Como se trata de um local de preservação, não é permitido entrar na água, só dá para molhar os pés em alguns pontos.





Para ficar um dia todo no Parque, é legal se hospedar nas vilinhas próximas a um dos 2 portões. Ficamos em Rastovača, praticamente uma única rua com várias daquelas pousadas típicas de montanha, todas com aspecto muito simpático. A nossa chamava-seThe Krizmanic Family, limpíssima, confortável, com uma pequena cozinha, sala e varanda.  


Split
A maior atração de Split são as ruínas do Palácio de Diocleciano, o imperador romano (século 3 a 4). O palácio era praticamente uma cidadela, tão grande que às vezes a gente não se dá conta de que está dentro da área que ocupava. Entre as muralhas e outros fragmentos da construção existem lojas, restaurantes, bares, hotéis etc., de forma que a gente pode, se quiser, tomar uma cerveja dentro do palácio de um imperador romano. O túmulo do sujeito está lá, todo imponente, dentro de uma igreja onde só se pode entrar cobrindo os ombros com um lenço, inclusive os homens. Levem seus próprios lenços, se não quiserem botar no ombro um paninho de uso coletivo.

Vale dar um espiada na gigantesca estátua de Gregório de Nin, um herói local. O pessoal gosta de alisar o dedão da estátua, devem imaginar que dá sorte ou algo assim.

Do porto de Split saem ferries em direção às ilhas próximas. Visitamos Stari Grad, na ilha de Hvar, e Vis, na ilha de mesmo nome, uma mais bonita do que a outra. Cidades históricas cheias de monumentos e praias muito bonitas, naquela batida croata de sempre, pedras e mar azul, calmo e fresco.




Há também cruzeiros e passeios de barco que podem ser contratados no porto, mas não fizemos nenhum. Gostamos mais de pegar um ferry e ficar o tempo que quisermos na ilha escolhida, mas isso é preferência pessoal.

Passamos 4 noites em Split e foi suficiente para nosso gosto, mas quem quiser explorar mais as ilhas não vai se entediar se ficar mais tempo.


Também fomos para Trogir, cidadezinha bem perto de Split, onde se chega facilmente de ônibus. Deixamos o carro alugado na vaga dele, para não ter que sair à caça de outro lugar para estacionar na volta, e pegamos o busão. Trogir também é lindinha, mais construções e mais calçamento de pedra branca, tudo muito croata. 




Dubrovnik
Nossa última parada na Croácia foi em Dubrovinik, cujo ponto alto é a cidade velha amuralhada. Nossa "praia" predileta na cidade era uma encosta pedregosa com escadinhas para entrar no mar, iguais às de piscinas. O banho de sol era um tanto incômodo mas o mar compensava adequadamente o desconforto. Praias de areia macia enfeitadas de coqueiros, como as do nosso Nordeste, são melhores? Ah, são. Mesmo. Mas, se estiver na Croácia, faça como os croatas, ora.






Comunicação
Os nativos são amistosos e comunicativos. Os jovens falam inglês, alguns bastante bem, mas com os mais velhos o bicho pega. É o sistema croata, o sujeito te diz "good morning" e depois croata, croata, croata e no final um "OK?". Mas como eles falam com as mãos e os olhos que nem nós, os gregos e os italianos, alguma coisa sempre se entende.


Hospedagem
O problema da Croácia é que as opções de hospedagem mais baratas não são propriamente hotéis, são pequenos apartamentos que as pessoas alugam. Isso que dizer, nada de recepção e portaria 24 horas. Você combina com o dono o horário de chegada e ele te espera na porta. Aí você se atrasa, o cara vai embora e, naturalmente, nem pensa em deixar um bilhete para os infelizes dos brasileiros. Sim, aconteceu conosco em Zadar, e tivemos que pedir ajuda para um vizinho simpático que, por sorte, conhecia alguém que conhecia o proprietário.

Mas o pior aconteceu em Split, onde não respeitaram nossa reserva e nos deixaram na rua, depois de muito tentar brigar em inglês. Brigar em outra língua é horrível! Se forem pra Split, não façam reservas no Apartments Diocletian, é fria.


Comida
As cervejinhas radler sabor limão ou laranja, leves e refrescantes, são nossa a melhor lembrança da Croácia no quesito paladar. Com o vinho croata, vamos dizer que não tivemos sorte. 

Comemos muito bem na Croácia, mas em restaurantes italianos. Por sorte, parece que metade da Itália migrou para a Croácia e abriu um restaurante. De resto, comida sem graça, sem tempero e sem sabor. Mas, como vocês já devem ter percebido, nós somos muito chatos.